terça-feira, 8 de setembro de 2009

TORRES VEDRAS E A REVOLUÇÃO DE SETEMBRO DE 1836 - 2ª parte

A Revolução de Setembro de 1836 é geralmente apontada como uma afirmação da burguesia industrial e urbana, aliada à classe média dos comerciantes e apoiada pelas classes baixas, sobre os grandes proprietários rurais e a alta burguesia, defensores da Carta Constitucional de 1826.

Contudo, em Torres Vedras, não se revela muito evidente o domínio do primeiro grupo social sobre o segundo, tendo em conta a constituição social dos elencos camarários em exercício durante o chamado "setembrismo".
Entre a aclamação da Constituição de 1822 em Torres Vedras, a 20 de Setembro de 1836, e a proclamação da Carta pela Câmara local, a 13 de Fevereiro de 1842, existiram12 elencos camarários, por onde passaram 43 cidadãos, dos quais 24 eram "proprietários", maioritariamente rurais. Além destes, registam-se ainda 6 "fazendeiros" e 2 "lavradores". Entre os 11 restantes distribuem-se pelas seguintes profissões: 2 "mercieiros", 2 "advogados", 1 "médico", 1 "tabelião", 1 "professor", 1 "boticário", 1"logista e proprietário", 1 "cirurgião" e 1 "mercador".
Alguns desses cidadãos participaram em vários elencos camarários, ao longo de vários anos, outros apenas num, ou nem sequer tomaram posse.
As Câmaras eram formadas por 7 membros, nem sempre os mesmos ao longo do mandato, pois frequentemente pediam "escusa" do seu cargo.
Elaborámos um quadro, que por razões técnicas não conseguimos inserir no blog, mas que está disponível numa edição do jornal “Frente Oeste” de Setembro de 1996, onde podemos observar o peso dos vários grupos profissionais em cada elenco camarário.
Pela observação do quadro comprova-se o predominio dos "proprietários", que podemos considerar "rurais", tendo em conta o cruzamento de informações biográficas dos mesmos, contidas em diversos documentos do Arquivo Municipal de Torres Vedras, nomeadamente censos eleitorais, documentos fiscais e livros de acordãos. Aqueles, conjuntamente com os "lavradores e "fazendeiros", mantêm a maioria absoluta da burguesia rural no seio do elenco municipal .
É curioso observar também que a Câmara "cartista", em funções antes da "revolução de Setembro", se manteve em funções até 13 de Março de 1837, numa altura em que a ala conservadora do Setembrismo já dominava a situação, assim como a ultima Câmara "setembrista" se manteve em funções até quase um ano após a restauração da Carta.
Mais curioso será notar que nesses dois elencos camarários encontramos dois vereadores comuns, enquanto os presidentes dessas duas Câmaras tinham afinidades familiares.
O ano de 1837 foi aquele que se revelou mais conturbado, tendo conhecido cinco elencos camarários ao longo de 12 meses, dois dos quais nomeados interinamente e um deles dissolvido por irregularidades eleitorais.

 
Os Rostos do Poder
Ao longo do "Setembrismo" presidiram à Câmara de Torres Vedras as seguintes personalidades:
-De 20 de Setembro de 1836 a 13 de Março de 1837, em funções desde 15 de Janeiro de 1836: António Pedro Ferreira Campelo, Lavrador (alguns anos depois já era proprietário).
-De 13 de Março de 1837 a 19 de Setembro de 1837: Estevão José da Silva, Proprietário.
-De 19 de Setembro de 1837 a 15 de Outubro do mesmo ano: António Agostinho Ferreira de Carvalho, Proprietário (Presidente interino).
-De 15 de Outubro a 18 de Novembro de 1837: Estevão José da Silva.
-De 18 de Novembro de 1837 a 1 de Janeiro de 1838: António Agostinho Ferreira de Carvalho (Presidente interino).
-De 1 a 27 de Janeiro de 1838: Estevão José da Silva. Abandonou o cargo por ter sido nomeado Administrados Substituto do Concelho. Em 1 de Janeiro de 1839 tornou-se Administrador do Concelho de Torres Vedras, posição que ocuparia pelo menos até Fevereiro de 1842, quando da restauração da Carta. Este cargo era de nomeação governamental e politicamente mais importante que o de presidente da Câmara.
-De 27 de Janeiro de 1838 a 1 de Janeiro de 1839: Dr.José Eduardo Cezar , Proprietário da Quinta da Marinha, em substituição do anterior nomeado para novo cargo.
-De 1 de Janeiro a 18 de Abril de 1839: João Victorino Pereira de Castro, Cirurgião.
-De 19 de Abril a 2 de Maio de 1839: Dr.José Eduardo Cezar (nomeado interinamente).
-De 2 de Maio de 1939 a 1 de Janeiro de 1840: António Pedro Ferreira Campelo,
-De 1 de Janeiro de 1840 a 2 de Setembro de 1841: João Tavares de Macedo, Proprietário.
-De 2 de Setembro de 1840 a 2 de Janeiro de 1843: Ignacio Ferreira Campelo, Advogado. Foi esta Câmara que proclamou em Torres Vedras a restauração da Carta em 13 de Fevereiro de 1842.
Como se observa, também na presidência do município predominam os proprietários.
Existem contudo outras personalidades que, ocupando ou não tais cargos, nunca deixaram de exercer a sua influência ao longos dos mais de 5 anos e 4 meses em que o Setembrismo vigorou neste concelho, participando em vários dos elencos camarários.
Foram eles:
-José Miguel Franco, Proprietário da Quinta do Infesto, vereador em 7 Câmaras, num total de 4 anos, 2 meses e 4 dias de serviço;
-Boaventura dos Santos Franco de Carvalho, Proprietário da vila, exercendo cargos municipais em 6 Câmaras, num total de 3 anos e 6 meses de serviço;
-Amancio António Xavier de Buitrago, Proprietário do Turcifal, servindo 5 vereações, num total de 3 anos e 9 dias;
-João Felix Gomes de Azevedo, Lavrador da vila, ao serviço de 4 elencos camarários, num total de 2 anos, 4 meses e 24 dias.
Tendo em conta todo o conjunto de dados atrás referidos, bem como o facto de encontrarmos entre as várias vereações deste período os então proprietários de 6 das mais importantes quintas do concelho, (Calvel, Macheia, Marinha, Infesto, Juncal e Póvoa), reforça-se a ideia de que, ao contrário do que aconteceu em Lisboa e noutros pontos do país, o "Setembrismo", em Torres Vedras, pouco terá beliscado a influência política e o poder da grande e média burguesia rural local.

Sem comentários: