quarta-feira, 7 de outubro de 2009

NO DIA NACIONAL DOS CASTELOS - Breves notas sobre o Castelo de Torres Vedras



Neste dia Nacional dos Castelos, deixamos aqui alguns “respigos” da história do Castelo de Torres Vedras, recolhidos ao longo de anos.

Não é uma monografia sobre esse importante monumento da cidade, apenas uns breves apontamentos de divulgação.

Embora com vestígios da época romana e existente na época muçulmana, provavelmente como mera torre defensiva, é a partir da sua integração no reino cristão de D. Afonso Henriques que se recolhem as informações mais pormenorizadas.

Sobre essa “conquista” várias “e desvairadas coisas hão sido escritas e ditas sobre esta velha fortaleza medieval, que o Fundador reduziu e trouxe ao senhorio das portucalesas gentes, entre os anos de 1148 e 1150, provavelmente no dia em que a Catolicidade festeja a Assunção da Virgem - 15 de Agosto- pois que ainda em princípios do século passado os párocos da igreja de Santa Maria, no dia 14 à noite, mandavam fazer grandes fogueiras, “não só no seu adro, mas também por entre todas as ameias do Castello”, seguindo remota tradição comemorativa do facto. Por outro lado, Madeira Torres, que escreve em 1819 e foi prior da dita igreja, afirma que o orago desta é Nossa Senhora da Assunção, o mesmo afirmando o padre António Ribeiro, que exercia o curato no ano de 1758 (...), escrevendo, ainda em reforço desta sua asserção: “...e por sima da simalha do mesmo retabolo se ve outra imagem da mesma Senhora em pintura no passo da sua Assunção a oleo e levada sobre os Anjos...”.

“Deve ter sido fero e cruento o ímpeto dos assaltantes e por igual heróica e contumaz a defesa dos sitiados; todavia o crescente foi definitivamente substituído pela Cruz, no altaneiro castelo(...).

“Dizem velhas crónicas que seus muros ficaram desmantelados e que Afonso Henriques houve de repara’los e repovoar o vetusto burgo ao qual concedeu foros e privilégios; que esta reparação foi executada com toda a ciência e solidez prova-o o facto dos moiros na sua retirada de Santarém, após a derrota que ali sofreram no verão de 1184, tendo destruído totalmente Arruda dos Vinhos e posto cerco a esta vila” (Torres Vedras) “, terem abandonado a empresa ao cabo de onze dias de baldados intentos de penetração, como conta Duarte Galvão”.(Rogério de Figueiroa Rêgo, “O Castelo de Torres Vedras”, in Estremadura-série II, nº20, 1949, pp.195 a 209).

A versão de Figueiroa Rêgo é uma versão algo romanceada e até desmentida pelos factos (Segundo a lenda, também Óbidos reivindicava essa data de 15 de Agosto de 1148, mais tarde desmentida por investigação mais cuidada. Nem que fosse pelo facto de D. Afonso Henriques não poder estar nos dois sítios ao mesmo tempo, tal versão parece pouco fundamentada).

O castelo sofreu grandes reparações nos reinados de D. Dinis e de D.Fernando

A 10 de Dezembro de 1384 o Mestre de Aviz iniciou o cerco ao castelo de Torres Vedras, onde chegou depois de ter conquistado Alenquer, vindo em perseguição do rei de Castela.

Este tinha levantado o cerco de Lisboa, devido à peste que atacou as suas tropas, vitimando a própria rainha D. Beatriz.

Torres Vedras pertencia então ao senhorio de Leonor Teles pelo que o seu alcaide-mor, o castelhano João Duque, vassalo da rainha, defendeu o seu castelo contra os partidários do Mestre.

Conta-nos Julio Vieira que as “hostes de D.João foram aposentadas nas casas em redor da vila, chamados do arrabaldes, estendendo-se o acampamento, segundo reza a tradição, pela varzea que delimita o perímetro de carcavelos e horta nova”.

Segundo a descrição do cronista Fernão Lopes, Torres Vedras era então “uma fortaleza assentada em cima de uma formosa mota, a qual natureza criou em tão ordenada igualdade como se à mão fosse feita artificialmente”.

Tinha “bom e gracioso termo junto consigo, e arredor de pães e vinhos e outros mantimentos, que naquele tempo, por azo da guerra, de todo o ponto eram gastados”.

A vila tinha “uma cerca arredor do monte e na maior alteza dele está o castelo; e entre a vila e o castelo moravam tão poucos que não é fazer conta; e toda a sua povoação era em um grande arravalde de muitas e boas casas de bem ordenadas ruas, ao pé do monte”.

Quando o Mestre chegou a Torres Vedras, o cerco ao castelo já tinha sido iniciado pelo seu partidário João Fernandes Pacheco “com gentes darmas e besteiros e homens de pé”.

Com o objectivo de conquistar a fortaleza defendida por João Duque, mandou o Mestre abrir um fosso sob a muralha. Contudo os seus defensores, avisados por espiões infiltrados entre os partidários portugueses, conseguiram anular o efeito surpresa da construção desse túnel, tapando-o e inutilizando-o.

Faltado entretanto a água nas cisternas do castelo, bem como a comida, pediu João Duque ao Mestre que lhe mandasse alguma carne fresca e “que este não levasse a mal ele defender o lugar, porque o fazia como leal vassalo de seu senhor” (D.Leonor Teles) “que lhe deixou esse cargo”, pedido que o Mestre aceitou, enviando carne para um dia aos seus inimigos defensores do castelo.

Houve ainda um encontro entre o Mestre e João Duque para que este se rendesse, mas sem resultados, retomando-se as hostilidades.

Foi então descoberta uma conspiração para assassinar o Mestre de Aviz, à frente da qual estava D.Gonçalo Teles, irmão da rainha , e Ayres Gonçalves, que se tinham feito passar por partidários do Mestre. Presos os conspiradores, um deles, Garcia Gonçalves, foi condenado à morte e queimado vivo à vista dos defensores do castelo.

Como vingança João Duque mandou cortar as mãos e os narizes de alguns prisioneiros pondo tudo ao colo de um deles, mandando-o assim ao Mestre.

Este, para se desforrar dessa crueldade mandou “lançar na funda do engenho dentro à vila os prisioneiros que tinha”, acabando contudo por não cumprir esta ameaça por “piedade” de última hora.

A conselho de Nuno Alvares Pereira, entretanto chegado a Torres Vedras, que temia pela vida do Mestre, e também porque se íam realizar brevemente as cortes de Coimbra, que aclamariam o Mestre de Aviz como rei de Portugal, este acabou por levantar o cerco ao castelo de Torres Vedras em 15 de Fevereiro de 1385, sem o ter conseguido conquistar.

Muitos habitantes de Torres Vedras, temendo pela vingança dos castelhanos, acompanharam o mestre na sua retirada.

Até “um cego que morava no arravalde ouvindo como o Mestre partia deste feito com aquelas gentes, começou a bradar grande brados, rogando por deus que o levasse consigo, não ficasse em poder de tão má gente”. Nuno Alvares Pereira, com dó do cego, mandou que o colocassem nas ancas da mula em que já estava, seguindo este com o exército português.

Data de 1514 a edificação do Palácio dos Alcaides, mandado por João Soares de Alarcão edificação acompanhada pela reconstrução do castelo efectuado a mando de D. Manuel, dois anos depois, em 1516.

Esta situação está testemunhada pela porta gótica ogival, com aquela data, encimada por esferas armilares manuelinas. Estas obras ainda continuavam em 1519.

O castelo volta a ter um papel militar importante quando as tropas do prior do Crato aqui chegam, ocupando-o sem resistência em 29 de Maio de 1589, para ser reconquistado para os castelhanos, após o fracasso da expedição daquele a Lisboa, por D. Martim Soares de Alarcão, o alcaide partidário de Filipe II.

Em 1749, um acordão da câmara alertava para a ruína de parte da muralha do castelo.

Já em parte arruinado, mas ainda habitado, o Castelo e a Igreja de Stª Maria sofreram graves danos no terramoto de 1 de Novembro de 1755.

Na Memória Paroquial de 1758 descreve-se o Castelo com estando “sobre um elevado monte, que lhe fica a parte do norte; tem no mesmo hum pateo com sua sisterna, a roda do qual em quadro tinha muntas, e boas salas, todas primorozamente pintadas, a que se sobia por duas destinctas escadas de pedraria lavrada, edeficio o mais nobre desta villa. He cercado todo a roda de huã forte muralha, e por fora desta outra antemuralha mais pequena; porem no terramoto de mil, sette centos, e sincoenta e sinco, as salas, que apezar do tempo ainda se achavão habitadas, neste destroço geral vierão seus tectos todos iteiramente abaixo, os remates das muralhas quazi em todo o circuito cahirão, fazendo em muntas partes varias aberturas, e sentimentos: Aqui se dis havia huas Torres Velhas, que derão nome à villa; e nesta conformidade se acha de prezente dezabitado, e so fica servindo a terra, que medea entre o dicto castello, e sua Muralha, e desta athe a antemuralha para se cultivar e semear.” (Memória Paroquial de 1758, resposta do pároco de Stª Maria).

Em 1810 o Castelo é integrado no conjunto de fortificações que formaram a primeira linha de defesa de Lisboa, como reduto nº27, sendo então reparado e guarnecido com várias peças de artilharia.

Em 1830 procedeu-se à reparação das suas muralhas, trabalho dirigido pelo coronel de engenheiros Lourenço Homem da Cunha de Eça.

Durante a guerra civil de 1846, a chamada “Patuleia”, foi ocupado pelas forças do Conde de Bonfim, que se opunham à Rainha, sendo por isso palco dos encarniçados confrontos que opuseram os dois exércitos em 22 de Dezembro desse ano, sendo o exército da rainha comandado pelo Duque de Saldanha.

Nessa ocasião foi ferido no Castelo Luís Mousinho de Albuquerque, que agonizou até falecer no dia 27, já depois da vitória de Saldanha sobre as forças “patuleias”.

Em finais do século XIX, o velho castelo de Torres Vedras começou a perder a sua importância militar e a sua manutenção tornou-se um problema para as autoridades militares.

Num ofício, datado de 18 de Julho de 1874, o administrador do concelho de Torres Vedras alertava a Direcção Geral de Engenharia para a urgente necessidade de se reconstruir as muralhas do Castelo, cujo estado ameaçava ruir e danificar as habitações próximas.

Aquela Direcção, na sua resposta ao dito ofício, afirmou não merecer a pena reconstruir as referidas muralhas, justificando essa afirmação com o facto do castelo de Torres Vedras não ter importância militar, propondo que a medida mais conveniente a adoptar fosse vender, por arrematação, a pedra de alvenaria e de cantaria das muralhas do castelo.

Felizmente para o nosso património, a Direcção Geral da Secretaria da Guerra, a quem coube a decisão final sobre o assunto, por carta de 6 de Novembro de 1874, tomou posição em defesa da salvaguarda dessas muralhas, "com quanto reconheça que o castelo perdeu muito da sua importância primitiva, não pode contudo concordar em absoluto com a opinião da engenharia; porque e até mesmo quando se admitia que o castelo é completamente inútil por não ter hoje valor algum como fortificação, não pode negar-se-lhe a importância histórica que na realidade tem este posto militar(...)" (Arquivo Histórico Militar, Lisboa).

O bom senso prevaleceu e o nosso Castelo é hoje o importante símbolo de que os torrienses se orgulham. Que lição para os dias de hoje!

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